terça-feira, 12 de maio de 2009

Star Trek: O início de uma jornada

Créditos do texto e das imagens: Marcos Caldas - http://www.hqmarcos.com/blog/

“E de repente percebi que minha jornada havia perdido as cores”.

Esse não é o lamento de um pintor desiludido com a vida, por saber que seu trabalho não é mais aquele de dias passados quando a vida saltava de suas telas. Pode parecer bobagem, mas essa frase é a síntese do que eu sentia ao assistir, repetidas vezes durante esses anos que me entendo por gente, aos filmes da série Jornada nas Estrelas. Eu como a maioria dos fans da série original, tenho meu filme preferido, mas qualquer filme da série por pior que seja, vale a pena ser visto e revisto. É como quando pegamos o caminho mais longo só por saber que ele nos proporciona a oportunidade de ver o mar, ou um belo por do sol. O roteiro é ruim, o vilão não tem motivação, o diretor não fez o dever de casa, mas é Jornada nas Estrelas.

Eu estudava no período da tarde e sempre que chegava da escola a primeira coisa que via era meus três irmãos mais velhos, sentados ao chão em frente a nossa pequena TV preto e branco de 14 polegadas, hipnotizados pelas aventuras espaciais da nave estelar Enterprise e sua audaciosa tripulação. Pouco tempo depois, as vacas engordaram e pudemos comprar uma TV colorida, o azul, o amarelo e o vermelho eram as cores dominantes na telinha.

No tempo em que se anunciava “o filme que deu origem a série” era “a única série que deu origem a um longa metragem” a chamada que nos fazia ficar de olho até nos comerciais. E a série criada por Gene Roddenberry nos fascinava como nenhuma outra forma de entretenimento poderia fazer. Finalmente assistir ao primeiro filme, Star Trek: The Motion Picture, dirigido pelo já falecido Robert Wise (O dia em que aterra parou, O Enigama de Andrômeda), foi uma experiência fabulosa. Trilha sonora maravilhosa, uma Enterprise novinha, linda, produzida com o melhor que a tecnologia dos efeitos especiais da época poderia fornecer, Klingons como Klingons deveriam ser, uma história fascinante, todos os personagens reunidos, as cores… bem, as cores não estavam lá. Era tudo meio pastel, mas ainda assim era Jornada nas Estrelas.

O segundo filme intitulado A Ira de Khan nos trouxe de volta um dos melhores personagens da série, com um roterio magistral, onde dois inimigos mortais se enfrentam sem jamais se encontrar fisicamente. Mas ficou tudo mudou, todos os uniformes eram vermelhos, e os caras de vermelho sempre batiam as botas. A ponte de comando ganhou um aspecto mais militar e austero, como um submarino espacial. Era Jornada nas Estrelas, mas era diferente. Não se tratava da série da TV na tela grande. Nos filmes seguintes, as preferências de um diretor após outro foram se sobrepondo a visão original de seu criador. As coisas mudaram um pouco quando o 6º filme da franquia, Star Trek: Generations foi lançado. Ele era baseado em Star Trek: The Next Generation, série de 1987, que havia trazido de volta as cores aos uniformes, ainda que de maneira meio louca, já que o capitão da nave usava o vermelho dos “Gonzales” que agora usavam o amarelo. Era Jornada nas Estrelas, mas com outra tripulação algumas décadas no futuro. E assim seguimos nossas vidas, indo aos cinemas e assistindo na TV as séries que seguiriam, por mais que estas, se afastassem do original

Dude, we are no more lost!

Quando foi divulgado que a tarefa de fazer o novo filme de Jornada nas Estrelas caberia a JJ “Lost” Abrams, a euforia tomou lugar do saudosismo. Afinal, a mente por trás de uma das melhores séries de TV de todos os tempos, no mínimo faria algo melhor que o último longa da franquia, Nêmesis. No rolar das águas o que eu achava se tratar de mais um capítulo da mesma novela, se mostrou uma inédita oportunidade de ver o universo, a nave, e tripulação da série original, como realmente deveria ser, no cinema.

Entre as especulações e boatos, crescia o medo que que tudo fosse uma terrível ilusão. Durante meses sem notícias oficiais o que restava era o vazio de ter de se contentar com uma foto desfocada de um ou outro elemento do set de filmagem.

Eis que vemos SPOCK. Puts! eu pensei. Era isso que todos queríamos, mas não encontrávamos coragem para aceitar, Kirk e sua tripulação ainda em plena forma, prontos para desbravar o inexplorado e fazer o primeiro contato com novas e peculiares formas de vida.

Em cores vivas

Foi em meio a toda essa enxurrada de novas imagens divulgadas na rede que me dei conta de que as coisas finalmente entrariam nos eixos. O azul, o amarelo, e o vermelho figuravam entre as muitas outras cores da palheta. A essa altura nem me importava se história a ser contada me agradaria ou não, afinal aquela era a boa e velha Jornada nas Estrelas.

Em meio a declarações condenadas por fans do mundo inteiro em foruns e sites na internet, renegando o que já havia sido feito para o cinema, surge um trailer recheado de frenéticas cenas de ação e que pregava “este não é o Star Trek de seus pais”. Que audácia! que blasfémia… que… que verdade.

Que trekker nunca sonhou em ver a tripulação com seus uniformes originais em um filme com efeitos de primeira linha? Que trekker nunca imaginou a NCC-1701 na tela grande do cinema? Está tudo lá, em sons, cores e BONES. Do início ao fim da projeção um deleite visual, um amálgama da polidez e elegância do futuro utópico imaginado por seu criador com a ficção científica do verossímel, onde naves parecem montes de sucatas com passarelas e corredores escuros e inexpressivos. O teletransporte nunca esteve melhor, a trilha sonora é diferente e também é única como foi no passado. O que vemos na tela é original. Kirk, Spock, MacCoy, Uhura, Scott, Sulu, Checov, em todas as suas facetas, o que fez da série original, única.

A dualidade de Spock, a turrice de MacCoy, a liderança, canastrice e até as pernas cruzadas na cadeira de comando de Kirk, marcam forte presença neste novo filme, que em seu roteiro aborda a viagem no tempo e universos paralelos, temas já explorados na franquia, mas nunca antes de forma tão dramática, extrema e determinante.

Em sua genealidade, JJ Abrams, nos apresenta o novo, sem esquecer o que já havia sido feito, nos propiciando o melhor de dois mundos.Todas as homenagens, citações, easter eggs (que não são poucos), e o desfecho com o clássico tema de abertura da série na voz de Leonard Nimoy, mas uma vez como em A Ira de Khan, é um presente aos fans, certificando que aquela é a primeira vez que a série original realmente ganha as dimensões da tela do cinema.

E que venham os Klingons.